Resultado da 1ª Conferência Nacional de Segurança Pública, o pacote de medidas para reforçar o combate à criminalidade que o governo vai mandar para o Congresso tem como carro-chefe um projeto de lei definindo um novo papel para as guardas municipais. Restrito hoje a cerca de 20% dos 5.585 municípios, efetivo total em torno de 70 mil homens - 20% deles concentrados no Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Fortaleza e Curitiba - e com atribuições que vão da vigilância de prédios a auxilio à polícia na segurança ostensiva, as guardas vão ter um pouco do poder que hoje está nas mãos da Polícia Militar e da Polícia Civil.
"Não é necessário modificar a Constituição para fazer as mudanças. Vamos regulamentar o parágrafo 8º do artigo 144, redefinindo as funções das guardas e explicando na parte penal o que significa tomar conta da segurança do município. Elas também poderão executar ações de segurança mediante convênios com as polícias estaduais", diz o secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Pedro Abramovay, responsável pela engenharia jurídica do projeto.
Abramovay garante que não haverá conflito de competências e exemplifica: a atuação das guardas na segurança pode ser semelhante ao que historicamente fizeram as polícias estaduais no combate ao tráfico de drogas. A repressão era uma atribuição exclusiva da Polícia Federal, mas foi repassada aos Estados através de convênios. Atualmente, seria impossível dissociar as apreensões de drogas das atribuições das PMs e da Polícia Civil.
O governo sabe, no entanto, que vai mexer em interesses corporativos das instituições tradicionais (Polícia Militar e Polícia Civil), das empresas privadas de segurança - que sobrevivem e crescem cada vez mais com a paranóia da insegurança, gerada pelos altos índices de violência - e, especialmente, com a falta de preparo das guardas municipais. Os distúrbios ocorridos há duas semanas na favela Heliópolis, em São Paulo, em protesto contra a morte da estudante Ana Cristina de Macedo, 17 anos, atingida a tiros supostamente por vigilantes da Guarda Municipal de São Caetano do Sul, no ABC paulista, conspiraram contra a proposta do governo no auge do debate. A falta de preparo dos guardas que perseguiam suspeitos e teriam disparado acidentalmente contra a jovem foi uma ducha de água fria na proposta, mas alertou o governo para a falta de treinamento adequado.
"A capacitação deve acompanhar as mudanças", diz Abramovay, que aposta na expansão do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci) como uma espécie de estágio preparativo das mudanças radicais que o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, pretende implantar antes do encerramento de seu governo. Temendo desgaste político, Lula demorou sete anos para tratar da segurança pública - um tema normalmente discutido emocionalmente e conectado à agenda eleitoral.
A municipalização da segurança pública, com um novo papel para as guardas, forçará o governo a adotar uma mudança ainda mais radical: retirar das Forças Armadas o controle sobre as PMs e os Bombeiros, um resquício do período autoritário garantido pela Constituição de 1988 que trata as corporações subordinadas aos governos estaduais como "forças auxiliares e reservas" do Exército. O fim desse vínculo, segundo Abramovay, foi uma das fortes conclusões da conferência que debateu a segurança pública. Por outro lado, no contexto do pacote de leis para reestruturar as Forças Armadas - outras medidas que devem ser discutidas nos próximos dias pelo Congresso -, o governo pretende dar ao Exército, Marinha e Aeronáutica poder de polícia para lidar com problemas de segurança interna, como nas operações em morros do Rio.
O pacote da segurança deve incluir ainda a proposta de autonomia para a perícia forense e a criação de ouvidorias externas para Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e Força Nacional de Segurança, setores que funcionarão sem vínculo com as corporações ou com as corregedorias já existentes. A criação das ouvidorias vai depender também do Ministério do Planejamento porque será preciso criar cargos - são mais de 20 para cada corporação - e, consequentemente, despesas. Mas corrige uma contradição do próprio governo federal, que exige ouvidorias nas corporações estaduais e municipais que recebem verbas da União para segurança. É também uma forma de estimular o controle externo das corporações e garantir a aplicação dos direitos humanos na segurança.
A mais forte modificação na atuação das polícias civil e militar, o chamado ciclo completo de ocorrências - o que equivale a dizer que ao atender uma denúncia de furto ou roubo a PM cumpriria todas as etapas da investigação e só encerraria a atuação ao encaminhar o caso à Justiça - pode não entrar no pacote que está sendo enviado ao Congresso. É que há divergências dentro do próprio Ministério de Justiça.
"Essa proposta agilizaria o atendimento à população. Ninguém precisaria mais chamar a PM e depois perder horas numa delegacia da Polícia Civil. E representa 70% das ocorrências policiais", defende o secretário nacional de Segurança, Ricardo Balestreri.
"Não é necessário modificar a Constituição para fazer as mudanças. Vamos regulamentar o parágrafo 8º do artigo 144, redefinindo as funções das guardas e explicando na parte penal o que significa tomar conta da segurança do município. Elas também poderão executar ações de segurança mediante convênios com as polícias estaduais", diz o secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Pedro Abramovay, responsável pela engenharia jurídica do projeto.
Abramovay garante que não haverá conflito de competências e exemplifica: a atuação das guardas na segurança pode ser semelhante ao que historicamente fizeram as polícias estaduais no combate ao tráfico de drogas. A repressão era uma atribuição exclusiva da Polícia Federal, mas foi repassada aos Estados através de convênios. Atualmente, seria impossível dissociar as apreensões de drogas das atribuições das PMs e da Polícia Civil.
O governo sabe, no entanto, que vai mexer em interesses corporativos das instituições tradicionais (Polícia Militar e Polícia Civil), das empresas privadas de segurança - que sobrevivem e crescem cada vez mais com a paranóia da insegurança, gerada pelos altos índices de violência - e, especialmente, com a falta de preparo das guardas municipais. Os distúrbios ocorridos há duas semanas na favela Heliópolis, em São Paulo, em protesto contra a morte da estudante Ana Cristina de Macedo, 17 anos, atingida a tiros supostamente por vigilantes da Guarda Municipal de São Caetano do Sul, no ABC paulista, conspiraram contra a proposta do governo no auge do debate. A falta de preparo dos guardas que perseguiam suspeitos e teriam disparado acidentalmente contra a jovem foi uma ducha de água fria na proposta, mas alertou o governo para a falta de treinamento adequado.
"A capacitação deve acompanhar as mudanças", diz Abramovay, que aposta na expansão do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci) como uma espécie de estágio preparativo das mudanças radicais que o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, pretende implantar antes do encerramento de seu governo. Temendo desgaste político, Lula demorou sete anos para tratar da segurança pública - um tema normalmente discutido emocionalmente e conectado à agenda eleitoral.
A municipalização da segurança pública, com um novo papel para as guardas, forçará o governo a adotar uma mudança ainda mais radical: retirar das Forças Armadas o controle sobre as PMs e os Bombeiros, um resquício do período autoritário garantido pela Constituição de 1988 que trata as corporações subordinadas aos governos estaduais como "forças auxiliares e reservas" do Exército. O fim desse vínculo, segundo Abramovay, foi uma das fortes conclusões da conferência que debateu a segurança pública. Por outro lado, no contexto do pacote de leis para reestruturar as Forças Armadas - outras medidas que devem ser discutidas nos próximos dias pelo Congresso -, o governo pretende dar ao Exército, Marinha e Aeronáutica poder de polícia para lidar com problemas de segurança interna, como nas operações em morros do Rio.
O pacote da segurança deve incluir ainda a proposta de autonomia para a perícia forense e a criação de ouvidorias externas para Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e Força Nacional de Segurança, setores que funcionarão sem vínculo com as corporações ou com as corregedorias já existentes. A criação das ouvidorias vai depender também do Ministério do Planejamento porque será preciso criar cargos - são mais de 20 para cada corporação - e, consequentemente, despesas. Mas corrige uma contradição do próprio governo federal, que exige ouvidorias nas corporações estaduais e municipais que recebem verbas da União para segurança. É também uma forma de estimular o controle externo das corporações e garantir a aplicação dos direitos humanos na segurança.
A mais forte modificação na atuação das polícias civil e militar, o chamado ciclo completo de ocorrências - o que equivale a dizer que ao atender uma denúncia de furto ou roubo a PM cumpriria todas as etapas da investigação e só encerraria a atuação ao encaminhar o caso à Justiça - pode não entrar no pacote que está sendo enviado ao Congresso. É que há divergências dentro do próprio Ministério de Justiça.
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